RETROSPECTIVA – 2010: O nascimento do Diário Contemporâneo

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No ano de 2010 Belém conheceu o Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia, projeto abrigado no Museu da UFPA e que nascia com o objetivo de trazer reflexões culturais, sociais, estéticas e politicas através da imagem fotográfica. A fotografia paraense já havia alcançado, décadas antes, um reconhecimento nacional, mas ainda não existia um projeto permanente para esta linguagem artística que continuamente estivesse formando, apresentando e analisando a arte contemporânea com um olhar mais descentralizado.

Seleção de trabalhos 2010. Foto: Irene Almeida

TEMÁTICA

O tema Brasil Brasis cabia muito bem à ideia de se pensar as múltiplas faces do país. Não há uma identidade e sim, várias. Uma cultura móvel que se monta, desmonta e se remonta de maneira dinâmica e imprevisível. O Diário Contemporâneo convidou os artistas a pensarem esses Brasis e compartilharem através das imagens suas ideias, questionamentos e ações sobre este país tão curioso. Ao mesmo tempo que já nasceu abrangente; pois mesmo sendo um prêmio de fotografia o projeto aceita propostas em vídeo, instalações, projeções e trabalhos que misturam suportes; o Prêmio, ao olhar o país em sua pluralidade de significados, apresentou a experiência intima do que é o Brasil.

COMISSÃO DE SELEÇÃO

O júri da edição de estreia foi formado por Cláudia Leão, fotógrafa, pesquisadora, professora em Artes e mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP; Eder Chiodetto, mestre em Comunicação e Artes pela USP, jornalista, autor, fotógrafo e curador independente especializado em fotografia; além de Mariano Klautau Filho, curador geral do projeto, fotógrafo, pesquisador, professor da UNAMA e, recentemente, doutor em Artes Visuais pela ECA/USP.

O trio premiou entre 282 inscritos os trabalhos de Octávio Cardoso (PA), Paulo Wagner (PA) e Coletivo Parêntesis (SP), além de selecionarem 22 outros artistas. O número de trabalhos submetidos ao edital já mostrava que o projeto tinha sido acolhido pela comunidade artística e estava com sua história apenas começando.

Cada um ainda teve a oportunidade de conversar com o público durante a programação do projeto. A palestras “Fotojornalismo Contemporâneo – Crise e Reinvenção”, com Eder Chiodetto; “Das Imagens e dos Esquecimentos”, com Cláudia Leão e “Territórios da Fotografia Contemporânea”, com Mariano Klautau Filho foram algumas das ações realizadas na 1ª edição.

ARTISTAS CONVIDADOS

Além de integrante do júri, Cláudia Leão também apresentou suas obras como artista convidada ao lado de Dirceu Maués. O artista, que recentemente conquistou seu doutorando em Artes na UFMG, é mestre em Artes Visuais pela Universidade de Brasília e desenvolve trabalho autoral nas áreas da fotografia, cinema e vídeo, tendo como base de pesquisa a desconstrução do dispositivo fotográfico. Ele apresentou os vídeos “Um Lugar Qualquer – Praia do Outeiro” e “Somewhere Alexanderplatz – Berlim”. Dirceu também teve a oportunidade de falar sobre o seu processo e pesquisa durante a palestra “De Outeiro a Berlim”, além de realizar a oficina “Fotografia para brincar de fotografia”.

Já Cláudia é uma das fundadoras do Caixa de Pandora, grupo com trabalhos de registro do patrimônio histórico de Belém e investigações semióticas. A artista apresentou trabalhos que misturavam retratos e fotografias de família através imagens presas em janelas e vidros. São obras construídas por meio da manipulação em laboratório fotográfico de memórias revisitadas em suportes como espelhos oxidados e vidros pontilhados.

Sem título, da série Lugares Imaginários, de Octavio Cardoso

PREMIADOS E SELECIONADOS

Os premiados na edição de estreia foram o Coletivo Parênteses (SP) que levou o Prêmio Diário Contemporâneo; Paulo Wagner (PA), vencedor do Prêmio Diário do Pará; e Octávio Cardoso (PA) que venceu o Prêmio Brasil Brasis.

O Coletivo Parênteses foi constituído por Paloma Klein, Rodrigo Antonio e Vicente Martos com o objetivo de trabalhar questões da atualidade através de múltiplas plataformas. As imagens de “Confluências”, série vencedora, apresentavam o espaço intimo doméstico com um item sempre ao centro, a televisão. Emoldurada por objetos afetivos e pela vida cotidiana, a tela apresenta diariamente a todos nós os outros Brasis.

“Preto Olympia”, “Azul Praça”, “Verde Barraca”, “Azul Amazônia”, “Cinza Avenida”. Os títulos dos trabalhos premiados de Paulo Wagner já denotam a sua relação anterior com a pintura. Imagens de cenários urbanos desfocadas e intervistas com formas geométricas apresentaram a cidade como uma paleta de cores.

A cor também foi destaque em na premiada série “Lugares Imaginários”, de Octávio Cardoso. O azul das imagens é hipnotizante e trouxe a sensação de sonho atrelado à memória. O fotojornalista usou o azul quase infinito para dar um tom mais subjetivo e menos documental às imagens que trazem um pouco da relação com as águas da Amazônia.

Além dos premiados e artistas convidados foram exibidos trabalhos de mais outros 18 artistas selecionados: Grupo UMCERTOOLHAR (SP), Flávio Damm (RS), Kenji Arimura (SP), Eurico Alencar (MA), Yukie Hori (SP), Pedro Motta (MG), Flavya Mutran (PA), José Diniz (RJ), Rodrigo Torres (RJ), Celso Oliveira (RJ), João Menna Barreto (RS), Haroldo Sabóia (CE), Felipe Pereira Barros (AL), Eliezer Carvalho (PA), Alberto Bitar (PA), Mateus Sá (PE), Sofia Dellatorre Borges (SP), Carlos Dadoorian (RJ).

A edição de estreia também concedeu menções honrosas à Walda Marques (PA), Gina Dinucci (SP), Felipe Pamplona (PA) e Flávio Araújo (PA).

Reflexões II, de Mateus Sá, selecionado em 2010

 AÇÕES

A programação do projeto contou ainda com a palestra “O mundo como fisionomia. Retrato ou paisagem?”, de Patrick Pardini que apresentou as diversas fisionomias (urbanas, arquitetônicas, minerais, animais, vegetais) obtidas através do formato do retrato, indicando uma relação muito mais intima com o que foi fotografado, mesmo que não seja a figura humana.

Miguel Chikaoka ministrou a oficina “De olhos vendados” com uma reflexão sobre a materialidade e o simbolismo da luz no fazer fotográfico. Miguel voltou à luz, gênese da fotografia, e convidou os participantes a desviciarem um pouco o olhar para além do visível, imediato e superficial.

Outro destaque da programação foi a oficina “Margem da Cor”, ministrada por Luiz Braga, com atividades e debates centrados na fotografia em cor como forma de expressão artística. O trabalho de Luiz tem o uso da cor como parte essencial da sua mensagem e o artista apresentou diversos efeitos que se obtém através do conhecimento da luz, suas diferentes fontes e intensidades.

O PROJETO

O Diário Contemporâneo contribuiu para a descentralização das questões sobre arte no país, pois há uma década vem lançando proposições e chamando os artistas para o debate, consolidando o Pará como um espaço de criação e reflexão em artes.

O Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia é uma realização do jornal Diário do Pará com apoio institucional do Espaço Cultural Casa das Onze Janelas, do Sistema Integrado de Museus e do Museu da UFPA; colaboração da Sol Informática, parceria da Alubar e patrocínio da Vale.

INSCRIÇÕES ABERTAS

Em 2019 o Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia comemora 10 anos de atuação. As inscrições da edição especial de aniversário já estão abertas e seguem até dia 13 de junho sendo realizadas somente pelo site www.diariocontemporaneo.com.br

Uma década dedicada à fotografia

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Em 2019 o Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia comemora uma década de atuação. O edital já foi lançado e as inscrições seguem abertas até 13 de junho sendo realizadas somente pelo site www.diariocontemporaneo.com.br.

Em 2010, na sua estreia, o projeto propôs o tema Brasil, Brasis a partir das diversas identidades contemporâneas que constituem o país. Já em 2014 a temática foi livre e agora, neste ano, o Diário Contemporâneo quer fazer um encontro renovado entre estas edições e propor a livre experimentação artística ao se pensar sobre as transformações que exprimem o país de hoje.

C Nova Feira, de Ionaldo Rodrigues, premiado com a residência artística em 2018.

Em 10 anos de atuação o Prêmio acompanhou diversas transformações na nossa sociedade. Segundo Mariano Klautau Filho, curador do projeto, os trabalhos exibidos “de um modo geral refletem o que ocorre no país, mas sempre a partir das questões propostas em cada edição no sentido de estimular o artista a pensar inicialmente em seus procedimentos e como eles irão traduzir as circunstâncias daquele momento. Esta décima edição toca especialmente em assuntos relacionados às identidades do país propondo um retorno à temática que inaugurou o projeto em 2010. Vamos ver como os artistas reagem a esse contexto”.

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FORMAÇÃO

O Projeto sempre quis ser mais que um edital, assim o Diário Contemporâneo se esforçou ao longo das edições em proporcionar ações como workshops e oficinas para o público, encontros com os artistas, formação de mediadores culturais e acolhida de turmas escolares nos espaços dos museus. Todo ano, milhares de alunos de nível fundamental e médio passam pelas mostras do Prêmio e são recepcionados por estudantes de Artes Visuais que passaram por um treinamento específico em cima da temática da edição, trabalhos selecionados e formação pedagógica de público crítico.

Um dos maiores exemplos do alcance do projeto é a Mostra Fotográfica “Retratos em Preto e Branco”, realizada há dois anos pelos alunos da Escola de Ensino Médio e Fundamental Cornélio de Barros, do bairro da Marambaia que, inspirados pelo que viram nas exposições, retornam à sala de aula e contam suas próprias histórias através da fotografia.

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ACERVO

Um dos legados do Diário Contemporâneo é também a sua Coleção de Fotografia Contemporânea que foi formalizada em 2016, após um intenso trabalho de organização sistemática dos trabalhos que o Projeto vinha reunindo desde a sua primeira edição. São fotografias, vídeos, instalações e outras linguagens produzidos por mais de 40 artistas de todas as regiões do país. Uma coleção de fotografia contemporânea que está sob a guarda das duas instituições públicas parceiras do projeto: o Espaço Cultural Casa das Onze Janelas e o Museu da UFPA.

“A coleção criada associa o Prêmio a um projeto mais duradouro e estabelece uma consciência museológica para a produção contemporânea na medida em que o Prêmio só existe na sua relação com os museus e a preservação do patrimônio público. E creio que deve ser uma poucas coleções de fotografia contemporânea brasileira com esse perfil, ainda que seja embrionária”, observou Mariano.

Além disso, no mesmo ano e incorporada à Coleção, através de uma parceria entre o projeto, o Museu da UFPA e a Tenda de Livros, da artista curitibana Fernanda Grigolin, o Diário Contemporâneo constituiu uma biblioteca que reflete um mapeamento da produção artística nacional. São fotolivros de artistas iniciantes e consagrados, muitos deles resultados de pesquisas acadêmicas. A equipe da biblioteca do Museu da UFPA realizou, inclusive, um estudo para aprender como catalogar esse formato novo.

Ionaldo Rodrigues e Ricardo Ribeiro, premiados com a residência, conversam sobre seus trabalhos e as experiências vividas. Foto: Irene Almeida

INTERCÂMBIO ARTÍSTICO

Ao longo dos anos o Diário Contemporâneo descentralizou os debates. “O Projeto vem contribuindo bastante com a circulação de uma produção nacional quando reúne artistas e pesquisadores em torno de atividades das mais diversas desde workshops até conferências e cursos”, disse Mariano.

O fotógrafo paraense Ionaldo Rodrigues acompanhou de perto a trajetória do Prêmio e analisou que “sendo também um projeto de debate e estímulo à produção artística desenvolvido a partir da estrutura de um jornal, eu percebo um diálogo entre o Diário Contemporâneo e o Suplemento Literário publicado na Folha do Norte entre 1946 e 1951. A partir de um outro contexto, acho que o Diário Contemporâneo segue uma linha  de valorização da formação, do debate crítico e da produção estética que coloca Belém numa interação muito produtiva com a cena nacional e internacional. A atenção que o projeto dedica à documentação e à memória do que é produzido durante as edições e a formação de uma Coleção vai oferecer uma base pra no futuro a gente entender a contribuição do Diário na pesquisa e produção fotográfica do nosso tempo, sem localismos ou regionalismos”.

Ionaldo participou da história do Prêmio de diferentes formas, desde como público na primeira edição, até ano passado, quando foi premiado com a residência artística em São Paulo. “Eu estudei sociologia na UFPA e tive o meu primeiro contato com fotografia como forma de expressão na Fotoativa durante a graduação, desde esse momento o que mais me atraiu foi perceber que fotografia podia ser um dispositivo de pensamento e expressão, um laboratório de experimentos em trabalho manual e intelectual. Ter participado do Diário Contemporâneo como público nas oficinas, exposições e atividades formativas, ministrando oficina e como fotógrafo nas mostras foi, pra mim, uma chance de experimentar várias possibilidades do fotográfico e construir um percurso. A publicação de dois trabalhos nos catálogos do projeto com uma mediação crítica foram, também, muito importantes pra mim”, finalizou.

SERVIÇO

O Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia é uma realização do jornal Diário do Pará com apoio institucional do Espaço Cultural Casa das Onze Janelas, do Sistema Integrado de Museus e do Museu da UFPA; colaboração da Sol Informática, parceria da Alubar e patrocínio da Vale.