A riqueza do candomblé nas imagens de Arthur Seabra

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Em Sob a luz dos candeeiros: movimentos do sagrado, Arthur Seabrafotógrafo paraense residente em Salvador, conta que os candeeiros precisaram ser utilizados em virtude da falta de energia elétrica ocasionada pela queda de um poste. Um cenário ancestral foi recriado pelo “acaso”, parecido com aqueles do século XIX e início do XX no Brasil, quando o povo preto em diáspora praticava o culto a orixá sob essas mesmas luzes, os mesmos cânticos, danças e instrumentos musicais. Arthur Seabra foi selecionado para a mostra Vastas Emoções e Pensamentos Imperfeitos.

Arthur Seabra e seu trabalho selecionado durante a montagem. Foto: Irene Almeida.

Confira o depoimento do artista:

Eu fotografo candomblé há um tempo já, desde 2015. A minha relação enquanto fotógrafo documentarista era, inicialmente, como pesquisador e depois com o passar dos anos eu entrei no mundo do candomblé e me tornei um adepto.

A minha relação com as pessoas desse ensaio, especificamente, é muito próxima porque eles são componentes do candomblé que eu frequento. É uma relação de confiança e respeito.

Eu curso antropologia então, de alguma maneira, eu sempre busquei conhecer, me informar, sempre tive interesse em conhecer mais as religiões de matriz africana, tanto que cheguei a me iniciar. É uma relação de família, a gente constituiu uma comunidade, nós somos uma comunidade de terreiro.

A nossa roça está localizada dentro de uma área rural no município de Camaçari, no interior da Bahia, dentro de uma reserva de Mata Atlântica protegida. A nossa vizinhança é de pescadores, agricultores, pessoas que trabalham com o cultivo, pequenos vendedores e artesãos. 

Como nós desenvolvemos o nosso trabalho em respeito à natureza tanto quanto eles, a gente goza de uma respeitabilidade. Mas isso eu sei que é algo pontual, a gente é a exceção, porque o que a gente vê, de uma maneira geral, é que os terreiros e as comunidades que estão em locais urbanizados sofrem muito mais com a intolerância religiosa, com o racismo religioso e com o terrorismo religioso.

A gente tenta sempre desenvolver uma boa relação, inclusive, trazendo eles para perto da gente no sentido de interagir, trocar experiencias e aprender o manejo que eles tem com a natureza.

Nós, como praticantes de religião de matriz africana, temos a natureza como base do nosso culto. Na história, elas sempre foram demonizadas e a gente procura mostrar para os nossos vizinhos que não é nada dessa imagem que nos foi pintada.

Detalhe de “Sob a luz dos candeeiros: movimentos do sagrado”, de Arthur Seabra. Foto: Irene Almeida

Nós temos um respeito profundo pela natureza, pelas relações. A gente tenta sempre combater essa ideia que foi construída e essas fotos também seguem neste sentido.

É mostrar e não mostrar. Elas têm algo próprio da nossa religião que é o segredo, uma vez que, historicamente, ela sempre foi muito atacada e precisamos desenvolver mecanismos de autodefesa e proteção. 

O meu trabalho fotográfico tem hoje em dia essa responsabilidade de mostrar a beleza do nosso culto, a riqueza que nós temos e a importância cultural do que o candomblé e que os nossos ancestrais escravizados trouxeram para a formação do povo brasileiro.

O Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia é uma realização do jornal Diário do Pará com apoio institucional do Museu do Estado do Pará, do Sistema Integrado de Museus, SECULT e do Museu da UFPA; colaboração da Sol Informática, patrocínio da ALUBAR e patrocínio master da VALE.

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Ação educativa realiza ciclo de encontros

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A edição de 2020 do Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia vem fazendo uso das tecnologias digitais para seguir com suas atividades de maneira segura dentro do atual contexto.

A inscrição dos trabalhos e a seleção deles foi feita de maneira digital. Com os dossiês escolhidos pelo júri, a coordenadora da ação educativa, Dairi Paixão, realizou um ciclo de encontros virtuais com os artistas. Tudo isso para conhecer melhor os trabalhos e as inquietações daqueles que os produziram. As conversas serviram de base para a composição das propostas educativas desta edição.

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Confira a entrevista:

Como que funcionaram esses encontros?

Foi um trabalho de escuta e reflexão para acessar novas informações e pensar como o educativo pode cada vez mais democratizar conhecimentos da arte para o público, tendo em vista a fala dos artistas como mais uma referência para o diálogo no espaço expositivo.

A conversa começou com Irene Almeida, da produção do Diário Contemporâneo, no diálogo sobre a ideias para o educativo deste ano, ela também acompanhou todos os encontros. Na sequência, conversei com Mariano Klautau Filho, curador geral do projeto, sobre o tema e as provocações do título da obra de Rubem Fonseca.

Segui também no diálogo com a curadora convidada da mostra, Rosely Nakagawa, para ouvir e compreender melhor o processo de seleção, a leitura das obras com o contexto que estamos vivenciando hoje, a conexão entre as obras selecionadas e a disposição das obras no espaço expositivo.

Depois do encontro com a Rosely, pensamos de promover esse ciclo de encontros com os artistas da mostra, a partir da localização dos artistas por sala. O ciclo de encontros durou uma semana onde, na prática, fomos adequando também com a disponibilidade de cada um. Mesmo assim, conseguimos promover encontros lindos, ricos de aprendizados, trocas e de fortalecimento com a arte.

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Como que foi essa troca?

Tivemos sete encontros de uma escuta muito preciosa para esses tempos que estamos vivendo. Cada um na sua casa e, mesmo distantes em diversos pontos do Brasil, nos conectamos por algumas horas. Nos encontramos e trocamos experiências e reflexões sobre as obras, a relação delas com os artistas das salas e o contexto contemporâneo do fazer de cada artista.

Foi possível conhecer um pouco do processo criativo de cada um e quais as sensações e significados que o trabalho tem na vida deles. Sinto que acessamos camadas mais profundas no conhecimento das obras, o que contribui na metodologia de como apresentar as obras para os mediadores durante o minicurso de formação.

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Qual a importância dessa aproximação, ainda que virtual?

Foi importante principalmente conhecer o processo criativo dos artistas. Por exemplo, ouvir do artista e arte-educador Iezu Kaeru (PE), sobre o projeto Kawa, qual o sentir dele com o rio, quais as cidades em que ele fez as fotos e como é o uso dele da fotografia digital e analógica. No bate-papo fizemos uma conexão de que o trabalho dele traz uma poética das águas. A conversa seguiu nas conexões que esse trabalho tem com o nosso território de Belém.

Para mim, tem sido um exercício pensar como construímos esse processo educativo e, principalmente, da mediação nesse território de Belém, na Amazônia.

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A conversa seguiu com o trabalho da artista Suely Nascimento (PA) e como nos conectamos com “A Casa de Marlene”. Quando Suely abre sua casa para que possamos sentir seu lar, também abrimos nossa casa interna e revivemos nossas memórias acompanhadas de um cafezinho da tarde.

Entendo também que a conversa entre os artistas se constitui numa potência educativa, de aprender com esse olhar do outro e que conta com muito afeto das subjetividades que constituem as obras. As conexões são múltiplas e a subjetividade de cada pessoa constrói novos signos.

No segundo dia, conhecemos os artistas Vanessa Ramos Carvalho (CE), Sérgio Carvalho (PI) e Beto Skeff (CE). Nesse encontro foi possível ouvir o afeto que Sérgio tem pela cidade de Barra Grande, no Piauí, e como o exercício da fotografia na obra “Um lugar lindo de morrer” atravessou um momento difícil de perda na vida do artista.

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Temas contemporâneos que muitas vezes nos sufocam nas notícias do dia a dia, como a morte, podem se tornar mais leves de lidar quando temos a arte mediando essa compreensão de sentimentos. O trabalho de Vanessa e Sérgio nos atravessou dessa forma.

Assim como no diálogo com Beto Skeff em que conhecemos a história dos campos de concentração no Ceará, além de quais as coincidências que ele percebe no fato de ter nascido numa cidade próxima a esses espaços.

No trabalho “Currais da Alma”, uma história que poderia se perder no esquecimento nos traz reflexões profundas sobre quantas histórias de opressões são apagadas no país e quais são ouvidas, debatidas, lembradas, além de como os relatos visuais são importantes para essa tomada de consciência da nossa história.

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Do mesmo modo, somos tocados pelo trabalho de Arthur Seabra (PA). No jogo de luz e sombra, que reflete um sentido espiritual diante das imagens de um ritual de Candomblé à luz de candeeiros, as fotografias nos levam para um tempo outro. Arthur compartilha dos significados da luz dourada referindo-se a realeza africana com muita beleza, cuidado e respeito. Ele nos aproxima da ritualidade sagrada de uma cerimônia de Candomblé.

Conhecemos mais sobre a paixão de José Diniz (RJ) por submarinos. Ele nos contou de seu fascínio desde a infância e sobre as diferentes experiências que viveu durante a pesquisa e criação das imagens do trabalho “O céu vem abaixo”.

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Como isso será refletido na ação educativa com os mediadores?

Cada encontro trouxe uma riqueza de detalhes do processo criativo, das obras, das escolhas e seleções de narrativa para a inscrição que nos aproximaram e nos trouxeram muitas compreensões, diálogos e debates sobre os trabalhos. Essa escuta fortalece a construção metodológica de apresentação dos trabalhos artísticos durante o curso de formação para mediadores e na construção do material didático presente no tabloide desta edição.

O Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia é uma realização do jornal Diário do Pará com apoio institucional do Museu do Estado do Pará, do Sistema Integrado de Museus, SECULT e do Museu da UFPA; colaboração da Sol Informática e patrocínio da Alubar.